Artigo
Existe teto para a remuneração de diretores de Organizações Sociais?
Em 11/10/2022, foi publicada, no portal G1, matéria denunciando que diretores de oito Organizações Sociais que gerenciam unidades de saúde no Município de São Paulo ganham salários superiores ao do prefeito Ricardo Nunes.[1]
Muito embora seja legítima a preocupação da imprensa em fiscalizar o valor de remunerações pagas com recursos públicos, necessário retificar algumas informações veiculadas na matéria.
Ao contrário do informado, a legislação vigente não fixa o subsídio mensal do Prefeito como teto para pagamento de remuneração dos diretores das Organizações Sociais. A remuneração deve se pautar pelos valores de mercado praticados por entidades congêneres, para cargos com responsabilidades semelhantes.
Isso tem uma razão de ser. A Organização Social é uma entidade de direito privado e não integra a Administração Pública direta ou indireta, estando submetida a um regime jurídico flexível, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADI 1.923, que declarou a constitucionalidade do modelo.
O Supremo Tribunal Federal, ainda, expressamente declarou que os diretores e funcionários das Organizações Sociais não são servidores públicos, mas sim empregados privados. Portanto, nada mais lógico que a sua remuneração esteja pautada nos valores de mercado.
Mais recentemente, no julgamento da ADPF nº 559, que tinha por objeto o julgamento do Decreto do Estado de São Paulo aplicável às OS, o STF entendeu que a regra que fixava o subsídio mensal do Governador do Estado como limite máximo à remuneração dos diretores das OS pode ser tida como excessivamente restritiva, por estender o regime da Administração Pública de forma quase integral às organizações sociais.
Na prática, é exigido dos diretores um grande preparo técnico, alto grau de especialização e dedicação exclusiva. A fixação do teto remuneratório afasta profissionais de grande expertise, que são naturalmente atraídos e captados por empresas privadas. Logo, se coloca o risco de instalação de uma diretoria desqualificada, em prejuízo não só da própria entidade, mas principalmente da sociedade que se beneficia das atividades desenvolvidas.
Não se trata, obviamente, de pagar salários que superam o valor de mercado, prática inaceitável que deve ser repudiada. Eventuais irregularidades detectadas pelos órgãos de controle devem ser combatidas, mas a aplicação dos limites do funcionalismo público viola diretamente o entendimento do Supremo Tribunal Federal e a lógica do modelo.
A matéria ainda dá a entender que as OS utilizam a verba pública de forma discricionária. Nada mais equivocado. Todos os gastos das OS são fiscalizados por órgãos de controle interno e externo, como Ministério Público, Tribunal de Contas, Corregedorias e Controladorias Gerais, a partir do envio de relatórios orçamentários e de atingimento das metas.
As compras efetivadas pelas OS seguem as regras estabelecidas no Regulamento de Compras e Contratações interno, aprovado pelo órgão contratante e publicado no Diário Oficial, e devem estar devidamente pautadas em pesquisa de preços dos fornecedores.
Apesar de algumas incompreensões ainda existentes, o modelo de OS já demonstrou resultados expressivos, conforme estudos que demonstram a sua maior eficiência e economicidade em relação a gestão direta pela Administração Pública.
Na medida em que atuam em colaboração com o Estado na prestação de serviços essenciais nas mais diversas áreas, as Organizações Sociais desempenham um papel essencial na promoção de direitos sociais. Esse papel só pode ser efetivamente exercido se assegurados os pilares centrais de sua atuação, dentre eles a autonomia privada e a flexibilidade de gestão.
[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/10/11/levantamento-aponta-diretores-de-os-em-sp-que-ganham-mais-do-que-prefeito-gestao-municipal-diz-que-vai-alterar-novos-contratos.ghtml
Raquel Grazzioli e Crislayne Lizieiro – Advogadas do escritório Rubens Naves, Santos Júnior