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Direito da saúde: por que nem todo erro médico gera indenização?

Quando um tratamento médico não dá certo, é comum que o sofrimento da família se transforme em um pedido de justiça. Mas no Direito brasileiro, nem todo erro leva à obrigação de indenizar. O que define a responsabilidade médica é a existência de culpa – por negligência, imprudência ou imperícia – e não apenas o fato de o desfecho ter sido negativo.

 

Há situações em que o médico segue os protocolos, solicita exames, acompanha o quadro, mas ainda assim erra no diagnóstico. Nestes casos, se ele agiu com diligência e dentro das boas práticas da medicina, o erro é considerado escusável – ou seja, compreensível diante das limitações técnicas e científicas. E quando o erro é escusável, não há dever de indenizar.

 

Na prática, o que se exige do médico é empenho técnico, não infalibilidade. A medicina trabalha com probabilidades, não com certezas. Exigir acerto absoluto seria ignorar a complexidade envolvida em muitos diagnósticos e tratamentos.

 

Três decisões recentes do Tribunal de Justiça de São Paulo ajudam a ilustrar isso:

 

> Em um caso de fratura não detectada, a perícia apontou falha no atendimento inicial, e a família foi indenizada.

 

> Em outro, a alegação de contágio por Covid-19 durante internação não se confirmou tecnicamente, e a responsabilidade foi afastada.

 

> Num terceiro processo, a demora na reavaliação de uma paciente levou à fixação de indenização por danos morais – não pela dúvida diagnóstica em si, mas pelo tempo de resposta inadequado.

 

 

Esses exemplos mostram que a análise deve considerar a conduta do profissional, e não apenas o resultado. Julgar exclusivamente pelo desfecho pode gerar distorções e estimular a chamada medicina defensiva: médicos que passam a agir com medo de processos, pedem exames desnecessários, evitam casos complexos e prolongam internações por precaução. Isso eleva custos, sobrecarrega o sistema de saúde e enfraquece a confiança entre médicos e pacientes.

 

A responsabilidade civil deve servir para reparar danos, corrigir desvios e reforçar limites éticos. Mas, quando aplicada sem critério, pune o risco, não a culpa. E isso fragiliza todos os lados.

 

Em um contexto de crescente judicialização da saúde, é essencial que o Judiciário saiba diferenciar o erro evitável da falha compreensível – para proteger de forma justa tanto os pacientes quanto os profissionais.

 

Por Diwlay Ferreira Ramos Santos Rosa e Wagner Roberto F. Pozzer

 

*Este artigo também foi publicado originalmente no portal Medicina S/A e pode ser acessado no link.